Uma das maiores empresas ferroviárias do mundo, a CRCC (China Railway Construction Corporation) estuda liderar um consórcio para construir a Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste) e integrá-la ao porto de Ilhéus (BA). Hoje, a ferrovia tem um pequeno trecho em operação.
A intenção dos chineses é clara: escoar soja (segundo principal produto que eles compram no país, atrás do minério de ferro) do Centro-Oeste até o porto baiano. Mas também há um interesse geopolítico. Eles querem criar alternativas ao canal do Panamá, obra bancada pelos EUA no século passado e que os asiáticos veem ainda hoje sob controle dos americanos. Para criar essa alternativa, a Fiol terá cerca de 1.500 quilômetros e cruzará com a FNS (Ferrovia Norte-Sul).
Hoje, os grãos precisam seguir de caminhões até o porto de Santos (SP) ou ser transportados até um entroncamento da Ferrovia Norte-Sul rumo ao porto de Itaqui, no Maranhão. No entanto, existem dificuldades de passagem no trecho controlado pela mineradora Vale, único ponto de acesso até o porto do Nordeste.
O plano dos chineses inclui outro braço ferroviário, a partir da Ferrovia Norte-Sul, que seguirá de Campinorte (GO) até Lucas do Rio Verde (MT) e, de lá, até Porto Velho (RO). Essa linha continuará rumo ao Peru até um porto no oceano Pacífico. O projeto foi apresentado pelo grupo chinês a representantes do governo brasileiro durante a viagem do presidente Michel Temer à China, no fim de agosto.
Desde então, o governo da Bahia já contratou a consultoria Accenture para desenvolver o projeto. Como a Fiol já é uma ferrovia prioritária da União, o governo baiano se comprometeu a transferir o projeto para o PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) assim que estiver pronto.
A expectativa é que isso ocorra até o início do próximo ano para que a ferrovia seja licitada ainda no governo Temer. Pelas conversas iniciais, os chineses teriam de entrar no leilão, embora tenham manifestado a intenção de realizar a obra por conta própria desde que o governo desse autorização.
O apetite dos chineses não termina aí. Três outros grupos também se apresentaram para formar um consórcio e construir os 934 quilômetros da Ferrogrão, entre Sinop (MT) e Miritituba (PA).
O projeto está em consulta pública e deverá consumir cerca de R$ 12 bilhões.
Dois são os motivos que levam as empresas chinesas a destinar recursos para infraestrutura no Brasil.
Nas conversas, o governo chinês deixou claro para os brasileiros seu interesse em ter a segurança de fornecimento de energia e ali- mentos. Por isso, não mede esforços nem recursos para investir em infraestrutura.
De janeiro a outubro, os chineses compraram US$ 19 bilhões em soja do Brasil, origem de 59% de todo o grão importado pelos asiáticos.
No mesmo período, o país importou US$ 5,5 bilhões em petróleo do Brasil.
Outra explicação é que o projeto permitiria à China uma alternativa ao canal do Panamá, que, segundo eles, é “controlado” pelos EUA.
VENEZUELA
O apetite chinês pelo Brasil vem aumentando especialmente depois da crise na Venezuela De janeiro a outubro, o país recebeu US$ 10,8 bilhões do gigante asiático, como já mostrou a Folha.
A maior parte desses recursos foi destinada a fusões e aquisições especialmente na área de energia e transporte.
Entre os exemplos, estão a compra de 45,36% da CPFL Energia pela State Grid Corp of China, por US$ 3,7 bilhões, e da hidrelétrica de São Simão, por US$ 2,26 bilhões, pela State Power Investment Corporation.
O interesse chinês também levou Pequim a fechar um acordo com o Brasil e criar, em maio, um fundo de investimento de US$ 20 bilhões destinado a financiar projetos de infraestrutura no país que sejam considerados relevantes para ambas as partes.